quarta-feira, 12 de novembro de 2008

red.

Red.
Give you a reason to stay.

(Por Priscila Valéria de Oliveira, 12/11/2008)


Eu pressenti que iria me matar quando sai daquele carro vermelho.

Acordei e não vi a presença dele em lugar algum do apartamento. Corri para a sala, olhei pela janela a rua, nenhum Peugeot 206 vermelho estava estacionado ali. Senti-me tonta, corri para o sofá, deitei de barriga para cima, encarando o teto branco.
Branco, um sofá vermelho, alguns fios de meu cabelo preto em meus olhos. Cores.
Qual seria a cor da aflição?
Encarei o teto, aceitando o fato de que ele nunca ia aparecer... Não,até eu morrer. Não, não o culpe, a culpa foi minha por ter o deixado escapar de minha vida. E eu não entendia o por quê de ter deixado, sou covarde, ligo mais pro passado do que no meu futuro. Apenas com ele eu teria um futuro.
Levantei do sofá, voltando para o quarto, abri o meu guarda-roupa, vasculhei algumas roupas e calçados, achei a combinação perfeita para o dia. Se ele me visse com aquela roupa, provavelmente pensaria que eu estava tentando seduzi-lo. Eu adorava quando ele pensava esse tipo de coisa. Enquanto me vestia e ajeitava o cabelo, comecei a pensar em todas as coisas que ele gostava em mim, as minhas meias de seda, meu pessimismo, meus cabelos molhados, meus olhos verdes e meus lábios vermelhos. As cores que ele dizia que eu emanava, minha voz rouca, todos os meus defeitos, minhas sandálias, meu modo de dirigir, meus cd’s, meus livros, minhas pulseiras, minha perna roçando na dele pela madrugada e o charme que eu tinha quando fumava. Ele gostava de mim, eu sei disso, gostava não! Amava, amava meu jeito, meu sorriso nervoso, meu jeito de mexer nos cabelos, amava a nossa combinação quando estavamos juntos.
Eu queria ligar pra ele mais ao invés disso, corri para a cozinha, peguei uma garrafa de vinho, e comecei a beber, em poucos minutos a garrafa estava vazia. Procurei outra garrafa debaixo da pia e, quando tentei a abrir cortei meu dedo com o abridor. Vermelho sobre o branco.
Fui ao banheiro levando a garrafa, o dedo sangrava muito. No piso branco do banheiro, podem-se ver alguns pingos de vermelho, como neve e bolas de natal vermelhas. Depositei a garrafa em cima da pia, enquanto lavava a mão esquerda. Encarei-me no espelho, e percebi que continuava bonita um pouco magra e abalada mais ainda assim bonita. E sem avisar, comecei a chorar. Era horrível chorar, ainda mais por me sentir culpada por tudo aquilo, como uma pessoa pode gostar de evitar a felicidade? Eu evitava e eu nem sabia por que!
Eu chorei porque eu o amava mais tinha medo de admitir pro mundo isso, porque eu estava ficando velha e não tinha feito tudo o que eu queria, porque eu era cheia de problemas familiares, porque eu era vulnerável a minha própria alma, porque eu não sabia se ainda existia uma alma dentro de mim quando ele estava longe.
Peguei a garrafa de vinho, sentei no chão do banheiro, encostei na parede e comecei a cantarolar um velho hit dos anos 80 que ele gostava. Eu amava tanto ele, tanto. E quando ele me pediu para aceita-lo por completo em sua vida, eu simplesmente sai correndo. E quando nos vimos, eu briguei com ele, inventei coisas que eu não gostava nele mais ele simplesmente não queria ir embora. Ele nunca me deixaria, se eu não tivesse falado o ‘eu não te quero mais’...Ele é tão bom, que mesmo depois de ter jogado aquilo na cara dele, ele respirou fundo e ficou encarando suas mãos que seguravam o volante. O desespero bateu sobre mim, pedi desculpas, o abracei, o beijei...mais nada foi retribuído.
Esperei ele me botar pra fora do carro, me bater...mais ele não fez nada, durante 30 minutos, e pode acreditar, que um dia você terá 30 minutos decisivos para sua vida. E quando ele me olhou novamente, ele apenas disse:
- Me dê um motivo pra ficar aqui.
Quando eu lembrei disso no banheiro, a garrafa de vinho já estava vazia, sentia-me tonta e melancólica. E sabia, que tinha chegado a hora.
Cacei um batom vermelho ali no banheiro, escrevi um bilhete no espelho ‘ele me ama muito, loucamente. Assim, como eu o amei’. Ele entenderia, fiquei imaginando se ele choraria com a beleza da cena.
Passei lápis preto, e ri lembrando que ele não gostava quando eu passava maquiagem, passei do mesmo jeito, passei as mãos pelo cabelo novamente, olhei para mim, meus olhos, meus lábios. Era eu ali, a que pertencia a ele.
Uma garrafa se quebra.

Eu só queria ter dado um motivo para ele ter ficado, mas eu sai pela porta e, nunca mais verei aqueles olhos pretos que me causavam arrepios. Nunca mais serei o que era antes dele, não encontrarei outro amor, nunca mais. Era só, eu, ele e nossas cores.
Era apenas um motivo e eu tinha vários mais eu não dei, covarde. E agora, eu estou vestida com o vestido preto que ele me deu no meu último aniversario, com os cabelos pretos caindo delicadamente nos ombros, os olhos verdes combinando com o preto do lápis, os lábios vermelhos com cheiro da bebida que ele amava, usando a sandália que ele mais gostava, sentada nesse piso branco frio, borrando meu corpo com um vermelho com ar de vida e morte: sangue.
Sem perceber, lhe dou um motivo para ficar: as cores, o vermelho mais lindo que eu poderia lhe dar, a combinação perfeita, entre vermelho, preto, branco e verde.
O motivo era esse: as nossas cores.

Ele ama vermelho e eu o amo.



escrito dia 12/11/2008. baseado em uma menina saindo de um carro para manter-se forte, em uma parcela de raiva,culpa, na chuva desse dia e em death cab for cutie.

[o relogio marca 22:18, exausta, triste, alegre. sentada com as palaras cruzadas, cadernos abertos em cima da cama, a franja cai nos olhos preguiçosos, está sem óculos, sem pulseiras, sem anel, apenas os cabelos soltos e o esmalte vermelho em suas mãos. ouve death cab for cutie, tentando encontrar um motivo para tudo isso. mais está muito cansada, vai deitar, ouvir death cab e acordar diferente. é o que ela espera;uma decisão.]

do mais, stay beautiful.

::deah cab for cutie_a lack of color::

Um comentário:

Tica disse...

lindo! meu deus, fiquei imaginando cada pensamento dela, incrivel, pri!